Não é novidade que a portaria 1.419/24 do MTE
- Ministério do Trabalho e Emprego entrará em vigor em maio deste ano e
atualizará a NR-1, uma das normas regulamentadores mais importantes para a
Segurança e Saúde no Trabalho. É possível encontrar inúmeros artigos relatando
as novidades, como a inclusão e o maior destaque aos riscos psicossociais, além
da sua respectiva prevenção. Ou seja, a ideia é prevenir para que a doença não
seja concretizada.
Nota-se que a referida portaria ministerial aborda de forma
central as doenças psicológicas, enfatizando a prevenção mesmo em caso de
"suspeita". Por isso é que houve a inclusão dos termos "risco
psicossocial" e "doença objeto de suspeita", sendo que esses
devem ser compreendidos de forma conjunta.
A título exemplificativo, caso um coordenador de um setor da
empresa identifique indícios de burnout ou sintomas depressivos no ambiente de
trabalho, é seu dever profissional, doravante, cientificar a companhia, para
que essa adote as medidas necessárias, a fim de que a suspeita não se efetive
como doença. O empregador, neste novo cenário, deverá se incumbir também de
contar com um psiquiatra do trabalho à disposição de todos os
funcionários.
Mais do que isso, as empresas devem focar em um ambiente
saudável como medida preventiva, evitando, com isso, os riscos e,
consequentemente, o aparecimento de doenças psicológicas. Deve prevalecer,
portanto, um local de trabalho que auxilie na manutenção da mentalidade dos
empregados, a partir da adoção de campanhas de conscientização; forte interação
entre os membros da equipe; um bom relacionamento com os líderes; uma
"fiscalização parceira"; e, claro, atividades extra laborais, dentre
outras medidas preventivas.
Como se vê, a ideia do MTE foi de implantar um gerenciamento
de risco ocupacional dentro das empresas que vise mitigar ao máximo os diversos
tipos de riscos ocupacionais oriundos de problemas na organização do trabalho,
como o excesso de carga de trabalho, as cobranças excessivas, os assédios moral
e sexual, os atos de discriminação, além de incluir problemas relacionados às
condições ambientais como ergonomia, ruídos e iluminação.
De forma mais ampla, a NR-1 poderá ser utilizada como
fundamento para sustentar penalidades aplicadas a assediadores no ambiente de
trabalho. Por exemplo, um líder dirigente sindical, que seja acusado de assédio
moral em face de seus subordinados, prejudicando o bom ambiente laboral, para
além da saúde mental de tais funcionários, poderá sofrer um Inquérito para
Apuração de Falta Grave visando justamente a sua imediata dispensa.
O alcance desta nova legislação, pautada na identificação de
fatores de risco psicossociais, traz ainda fundamentos para a gestão de Saúde e
Segurança no ambiente de trabalho, obrigando, assim, às empresas a zelar pelo
coletivo em detrimento do individual. E o motivo de tal prevenção é simples: em
matéria publicada no site de notícias G1, em 2024, as patologias mentais foram
responsáveis por 472.328 licenças médicas concedidas, resultando num expressivo
aumento de 68%, isso se comparado apenas com ano anterior1.
Todavia, nem sempre um ambiente perfeito e harmônico é o
suficiente para a prevenção ou recuperação de um empregado já vitimado. Afinal,
o fato gerador da patologia poderá ser diverso do ambiente laboral, a exemplo
do que ocorre com problemas familiares, monetários (apostas), dentre
outros.
Diante de tantas dúvidas e imprevisibilidades, como as
empresas podem se resguardar no futuro? Se a NR-1 impõe uma maior atuação das
empresas na preservação psicológica de seus colaboradores, poder-se-ia
implementar como programa de benefício, por exemplo, o pagamento de sessões de
psicologia?
É inconteste que tais sessões serão primordiais para a
verificação individualizada da saúde mental de cada empregado. Todavia, é
sabido que o investimento é muito elevado e, pior, boa parte das empresas não
teria condições de arcar com esses custos sem prejudicar a sua saúde
financeira.
Além do mais, superadas as sessões, em casos mais graves um
médico psiquiatra deve estar à disposição dos empregados para consultas
preventivas, direcionamento de tratamentos e indicação de medicamentos, se for
o caso.
E neste cenário um questionamento traz inquietação acerca do
tema: quantos são efetivamente os empregados que se cuidam mentalmente de forma
voluntária, seja com o auxílio de psicólogos, seja com a ajuda de
psiquiatras?
A título de comparação, hoje, via pesquisa da OAB Nacional
em parceria com a FGV, tem-se que 14% dos advogados brasileiros realizam
tratamento psicológico. Ora, a advocacia é sabidamente uma profissão
estressante, sendo que 14% é uma porcentagem tida por demais irrisória2.
Todavia, seja pelo custo financeiro, seja pela nossa cultura
brasileira, é certo que tais sessões comportam alto valor financeiro de
investimento, e muitos devem considerar, com certa razão, que a empresa seria
ainda mais onerada. Então, será que há uma saída para que a empregador promova
a prevenção aos riscos psicossociais da melhor forma possível sem aumentar seus
gastos?
Com efeito, o art. 458, §2º, inciso IV, da CLT, prevê que:
CLT, art. 458, § 2º. Para os efeitos previstos neste artigo,
não serão consideradas como salário as seguintes utilidades concedidas pelo
empregador:
(...)
IV - Assistência médica, hospitalar e odontológica, prestada
diretamente ou mediante seguro-saúde.
Destarte, conceder ao colaborador auxílio psicológico, tanto
individual quanto em grupo, não seria uma "assistência médica" de
caráter psicossocial?
E conquanto não esteja prevista expressamente na lei, a
ajuda financeira pode ser enquadrada como assistência médica, excluindo sua
natureza salarial. Logo, a empresa concederia benefício sem tributação,
ocasionando desconto na folha mensal. Há também a opção de trocar planos de
saúde mais básicos por superiores que contemplem sessões de psicologia e até um
médico psiquiatra.
Ainda, levada em conta aquela regra básica de
"pelo" ou "para" o trabalho, a condição de benefício fica
muito mais clara com esta nova portaria do MTE, visto que uma boa saúde mental
é requisito para que o empregado possa exercer suas funções da melhor forma
possível. Com isso, a nova NR-1 torna todo o meio de prevenção a riscos
psicossociais uma obrigação do empregador, cujas sessões de psicologia seriam
PARA o trabalhador exercer adequadamente as suas atividades com as melhores ferramentas
de trabalho disponíveis.
Assim sendo, com o dever de fiscalizar e proporcionar aos
colaboradores melhor saúde mental, visando reduzir as chances de doenças
psicossociais, a empresa igualmente pode e deve ser contemplada com um olhar
mais "flexível" pelos Órgãos Públicos, com a concessão de benefício
em prol da saúde de seus empregos e consequente reconhecimento por sua natureza
indenizatória.
Quanto à jurisprudência, por ora não há decisões abordando a
matéria e sua natureza salarial por ser tema muito recente. A empresa de
benefícios flash, v.g, apenas em julho do ano de 2024, passou a oferecer o
vale-terapia, ou vale-psicólogo, sendo o benefício oferecido pelas empresas aos
seus colaboradores, que subsidia o acesso a sessões de terapia com psicólogos
credenciados4.
Num futuro próximo, a partir da fixação de um entendimento
dos Tribunais, as empresas terão mais segurança para conceder tais sessões,
combatendo de forma efetiva essa "epidemia" de patologias mentais.
Lado outro, no atual estágio, muitos empregados até já acometidos não levam a
sério a necessidade desse tipo de tratamento, notadamente pelos valores
despendidos e a condição financeira de cada um, o que seria sanado com a
concessão do benefício.
Em arremate, num cenário com a concessão de tais benefícios,
a empresa teria um excelente ambiente de trabalho, além de conseguir descontos
na folha de mensal, sem o encargo tributário; os colaboradores estariam em
tratamento constante, com chances de prevenir doenças mentais; o INSS com uma
provável redução de afastamento previdenciários por questões psíquicas,
repassando à empresa o tratamento via benefício; e a sociedade, em si, pelo
conjunto da obra.